quinta-feira, dezembro 23

Eu te amo... não diz tudo!

Uma pausa em Expedição Cuba!(...)
2010! Um ano inteiro ao fim. De um fim para um começo. E é tempo de (re)começar...

Nos tempos de menina rebelde, sapeca e inocente sentia uma certa felicidade no mês de dezembro. Porque era fim de ano, porque eram férias escolares e sempre íamos à praia, porque sabia que a grande família estaria toda reunida, porque ganharia aquele tão esperado presente e porque era absurdamente louca pra completar logo meus 15 anos - pensava que alguma coisa de espetacular aconteceria nos meus 15 anos! (...) Sempre assim, nesse mesmo ritmo de sinais positivos perante a um coração vazio, mas cheio de expectativas ao ano seguinte.
E o ano dos meus 15 anos chegou! Meninas sorridentes de peitos "verdolengos" apontados para a lua fazem escolhas: ou festa ou Disney! Não tive escolhas. Eu só queria alguma coisa, mas não sabia o que era. Mesmo assim, sem muita manifestação ganhei uma festa. E foi ai que descobri como é bom ganhar presentes e  porém, como é ruim aquela amiga riquinha lhe presentear com uma blusa de marca ao qual não te serve. A porr@#$% da blusa fica lá no guarda-roupa até o dia que sua mãe descobre e dá pra filha da empregada. ( e como ficou linda nela)...
E outros anos se passaram... outros sorrisos, outras lágrimas, outras pessoas, outras viagens, outros amigos, outras aventuras.... outras e outras coisas mais... mas nessa mesma vida. Vida essa que se morre e se (re)vive, que se cansa, que se acostuma, que se conquista, que se exige!(...)
Quando menina sentia uma certa felicidade na certeza de que meus pais estariam ali, no quarto ao lado. Sonhava com um quarto só pra mim, mas eu tinha ali, duas irmãs, companheiras de fim de noite até se transformarem em personagens dos meus piores pesadelos. (o medo tomava conta naquele quarto - mas sabíamos que o quarto dos pais ficava ao lado e corríamos pra lá, antes que alguma bruxa nos pegasse)...
Já não vivi mais aquela tal felicidade. E que nem sabia que o que sentia ou o que vivia era a mais pura de todas. Já não há ceias fartas com toda uma família e gerações. Já não divido quarto com as minhas antigas companheiras e nem choro de medo por elas e com elas. Já não sinto aquela mesma segurança de saber que no quarto ao lado poderia encontrar todas as noites duas pessoas que diante de tudo, faziam-me feliz e protegida.
Meus 15 anos passaram e com eles tudo aquilo que lhes pertenciam.
Dez anos depois, encontro-me com aquele mesmo coração vazio e com aquela mesma vontade de ter alguma coisa. A diferença é que hoje eu já sei o que quero... Eu quero é dizer:
"Eu te amo!"... não diz tudo, mas digo  para quatro pessoas que fizeram e fazem parte da minha construção, da minha base... dessa louca arquitetura que somos moldados. O amor é sentido. E eu sinto amor, sem ofegar, mas com muitos suspiros. Eu sou o amor porque me sinto amada. Na distância, na doença, na tristeza... eu sinto o amor, principalmente nessas ocasiões. Nas minhas decisões, nos acontecimentos, nas minhas aventuras e nos meus desapegos... é tão forte que chega ser visível.
Sou amada porque me deixam ser... deixam-me por ai, pelo mundo. Porque sabem que sou aquela base sólida de amor aonde quer que eu vá. Eu os amo porque os deixo ser. (todos longe porém muito próximos). E desse amor nasceu mais uma vida - sou tia de um lindo ser que veio ao mundo pra mais uma etapa e uma geração. Eu também o amo, mas não o vejo. Ele sente, porque quando se tem vida se tem amor. (Minha irmã do meio vive em outro país, minha irmã mais velha vive em uma outra cidade e meus pais também).
Talvez já tenha dito mais vezes "eu te amo" à um homem do que pra minha família...
Mas dizer "Eu te amo", NÃO DIZ TUDO!
Porque o amor verdadeiro é sentido e não falado. É vivido e não sonhado. É eterno e não "infinito". É constante e não momentâneo.
Já tenho de volta aquela felicidade de menina. Porque hoje, em dezembro, revivendo momentos com minha família, já ganhei um presente e mesmo não estando de férias posso desfrutar de uma paz conquistada por um coração ainda vazio - meu maior presente é poder amar vocês e saber que, mesmo se falar... NÃO DIZ TUDO!
Feliz Natal a todos e que venha 2011 - não é o país do futebol?? Então a gente mata no peito!!!

domingo, dezembro 19

Expedição Cuba - PaRtE 8

Trinidad de Cuba
...Escutando "Grandes voces del son cubano" "El Jilguero de Cienfuegos...

A disposição era tamanha que parei em duas cidades num mesmo dia. Um dia radiante.
Já fazia parte de Cuba.
Trinidad e Cienfuegos foram duas cidades em que vi a hora passar, bem lentamente...
Já não pensava, não concluia e não falava. Eu apenas caminhava. Não ouvia vozes e não desconfiava do que estava por vir. Mas não veio. E eu ainda caminhava.
Senti um grande vazio em Trinidad. O chão batido empoeirava meus pés até a canela. Não existia sombra naquele lugar. Era um vazio no meio do nada. Mesmo em um negativo súbito consciente, ao meu redor tinham rostos felizes. Pessoas sorriam ao mesmo tempo que ofereciam seus adornos para troca ou venda. Eram cordões e enfeites de sementes de árvores cubanas. 5 cordões por 2 cucs. Aquilo era muito familiar, não me chamava atenção, pois as sementes são muito semelhantes com as nossas, aqui do Brasil. Mas comprei, comprei 10. Não que eu as usasse todas de uma só vez ou, a cada dia da semana colocasse um. Eu trouxe para presentear. Só depois percebi que não restara para mim. Fiquei sem, mas fiquei feliz. O que eu carrego é muito mais que um cordão, charuto ou qualquer coisa que trouxera de Cuba. O que tenho é único, é belo é intransponível - eu tenho a lembrança de um lugar que sonhei estar. Eu tenho em mim a liberdade conquistada. Tenho a viagem como um grande desafio, uma espécie de amor. Sinto-me amada. Essa é a minha verdadeira relação com as viagens.
... Mas eu não pensava em nada. Cienfuegos chegou. Uma cidade limpa, simples, solitária... O mar ao fundo e a praça no centro. Parecia uma exposição de carros antigos.
Um dia inteiro pra não pensar em nada. Foi assim em duas cidades cubanas.
...Hora de voltar à Havana. Pegar estrada, horas e horas vendo passar aqueles lugares que, fizeram-me não pensar. Definitivamente eu consegui viajar. Isso é que chamo de liberdade.
As fotos falam por mim:




Cienfuegos

terça-feira, dezembro 7

Expedição Cuba - PaRtE 7

Em Sancti Spíritus

...Daí quando me dei conta, já estava em uma outra cidade, e aquilo era tudo muito real. Pisava firme naquelas pedras e sentia a areia roçar no meu dedo do pé. Só sabia andar. Tudo aquilo era muito normal. Foi tão óbvio que a sensação veio em forma de "uma poça no chão". Sim, eu pisei na poça em uma rua deserta.
Fui andando sem pensar em voltar e percebi que aquele sonho cresceu. Estava exatamente lá. Um lugar que sonhei por muito tempo. O sonho cresceu, libertou-se de quem o sonhou. Estava naquele momento, desprendendo-se do meu próprio sonho, em uma rua deserta de Sancti Spíritus.
Eu respiro, eu sinto prazer. Valorizo um sonho conquistado!
Das casas, das ruas, das construções... O que queria mesmo era estar por ali, andar e enxergar um pouco de esperança. Um pouco de chuva e um pouco de vento ...
Das lojas, vitrines com televisões antigas à venda, toca discos e vídeos cassetes. Charutos em caixas de madeiras, lacradas com um selo de garantia e originalidade. Optei por charutos individuais, saiu mais barato 7 charutos unitários do que uma caixa com 5. Os melhores: Cohiba, Romeo y Julieta, Partagas, H Upmann, Monte Cristo... O mais caro e o mais forte: Cohiba (charuto preferido de Fidel). Trouxe essas marcas. E uma caixa de Monte Cristo que parece um livro.
Há aqueles que vendem charutos clandestinos, não têm marca e saem pela metade do preço. Um pacote contém 10 charutos. Porém você não sabe se é tabaco, se é folha de bananeira, se é bosta seca de vaca... 
Uma chuvinha fina batia no telhado daquela tabacaria, como se quisesse me avisar: ' ei se manca, vá embora!
O cansaço bateu.  Mas havia silêncio, tranquilidade. Cuba é uma paz que se sente. É uma paz inventada.
Fui então, para um hotel na beira da estrada. Árvores e pássaros, aquilo tinha clima de aconchego.
Uma carta em cima da cama, dando-me boas vindas. Uma folha de caderno cheia de desenhos à giz de cera e as palavras, à caneta. (Trouxe comigo, achei aquilo tão familiar).
Uma sopa, uma cerveja, um livro, um banho e um dia que já se tornara noite. Uma leitura na piscina e fiz um carinho em mim mesma lendo aquelas saudosas palavras de Ernest. Mas nesse  dia, a solidão me encontrou. Estava ali, eu e um livro a beira de uma piscina,a beira de um colapso. O drama veio em forma de frases - escrevi três frases no meu caderno de anotações: 1ª- eu tenho sede; 2ª - eu estou aqui e 3ª - eu sinto saudade...
Hoje, já não sinto sede e nem estou mais lá... Mas continuo com a saudade. (saudade criada por uma escolha temporal - saudade de coisa ainda não vivida, mas já sentida - de se ter a pura felicidade, a mais verdadeira de todas)

quarta-feira, dezembro 1

Expedição Cuba - PaRtE 6

Memorial Che - Santa Clara
...Já me disseram que visitar um país e só conhecer sua capital é a mesma coisa que comer queijo com goiabada... Mas sem a goiabada. (belas palavras)... Portanto, mais um dia em Havana e eu já não me satisfazia com aquele "desayuno" compartilhado. (todos num mesmo ambiente e indiferentes, uns aos outros - até que nos últimos dias já trocávamos olhares e um sorriso sem graça)...
 Havana já não fazia parte dos meus sonhos. Já era pra mim, uma realidade desconhecida. Uma pura e simples realidade conquistada. Havana sem dúvida era motivo de muita festa! Um festival de sensações...
 Mas precisava seguir por outros caminhos... (segui por outras cidades do interior, mas retornei à Havana -  contarei em outro post)...
 Fui então à Santa Clara, quis muito ver de perto o túmulo do Che e estar em seu memorial (local em que Fidel fez um discurso e caiu quase de cara no chão)... Silêncio. Essa foi a ordem antes de chegar em seu mausoléu. Não pode tirar fotos, falar, comer e apresentar-se com trajes de banho. Entra-se numa porta, vira a esquerda, dobra a direita e pronto. Está lá, uma caixa de cobre  e no centro sua imagem. Atrás, outras caixas de cobre com outras imagens, eram todos aqueles ex-revolucionários. Dizem por ai que o corpo de Che está na Bolívia ou em um outro lugar. Mas eu o senti em Santa Clara. Flores ao chão e uma vela acesa. Lembrei-me do museu do Vaticano, em que o túmulo do Papa João Paulo estava lá, frio e sem graça, mas com flores, velas e silêncio. Lembrei-me também, do túmulo de Evita Perón em Buenos Aires, entrei numa fila dentro do cemitério e quando chegou minha vez de olhá-la pensei: - o que estou fazendo aqui? Ela está aqui?! 
De Havana a Santa Clara são 3 horas e meia de ônibus. Uma estrada calma, vazia... ao lado, uma mata robusta, uma mata virgem.
Uma linda cidade colonial com um centro histórico bastante preservado. Suas características: abrigar importantes universidades e ter o minério e a cana-de-açúcar como potenciais em seu comércio.
As praças, o chafariz... as margaridas e o sol.  Girassol à venda... "o cotidiano é raridade"...
 Nos arredores de Santa Clara, em direção o povoado de Remédios, encontra-se o Trem blindado, com os vagões originais que o Che Guevara fizera descarrilhar. Santa Clara viu o conflito mais violento entre militares de Fulgêncio Batista contra os revolucionários (irmãos Castro, Che e Camilo Cienfuegos)

 Hora do almoço. Comi tudo aquilo ao meu alcance, com muita vontade. Queria agarrar essa oportunidade de comer o melhor do simples. Comida cubana é extremamente saborosa.
Na terceira garfada escuto uma voz suave determinando um estilo musical. Era um bolero! Um grupo cubano se aproximou da mesa e tocou suas melhores músicas... Comia e mexia os ombros, simultaneamente. Até que, virei-me para trás e com um entusiasmo meu tímido mostrei minhas mãos ao alto aplaudindo todos, um por um. Perguntaram-me: "quieres una música?" Disse: - Comandante Che! Fechei os olhos e só sentia os pelos dos braços levantarem - isso que eu chamo de arrepio! Cantei ali, na mesa mesmo ao lado de um casal espanhol, duas alemãs e "una bella italiana". Quando, no meio do refrão, sinto um cutucar nas minhas costas. Não, não era "El comandante" era o cantor me chamando pra tocar com eles. (Ele realmente não sabia o que estava fazendo, ahahah) Eu fui! Deram-me o chocalho e eu acompanhava a música como se fosse a coisa mais natural da minha vida. E foi! Toquei com sentimento de liberdade. Perguntaram-me de onde eu era. OOO brasileña! "Olla que cosa mas linda, mas llena de graça, es essa chica que vem e que passa..." Num portuñol violento, cantaram em minha homenagem e eu lá no chocalho, "chocalhando" de rir...
  Falando de música, Santa Clara é o berço do famoso compositor e pianista cubano Rubén González, que é conhecido principalmente como membro do Buena Vista Social Club. 
Depois do animado almoço voltei com um outro planejamento. O planejamento para fim de tarde. Cansada e suada, o que eu mais queria era sentar numa praça e admirar. Ajeitei-me na pontinha de um banco, busquei o máximo de sombra possível. Foi ai que me dei conta de que sentara em frente a uma escola e exatamente no horário de saída "de los niños". Crianças uniformizadas naquele calor de 40 graus, com meias esticadas até a canela saiam em direção aos adultos. Algumas entravam naqueles carros velhos, outras subiam na bicicleta do pai amarrando bem firme seus livros na traseira. Outras sentavam naquela praça e,outras seguiam seu caminho a pé. De longe participei de um papo demorado entre duas jovens. Elas se olhavam, e nessa troca além de cumplicidade, tinha-se tristeza. Um vento triste. 
Fiquei tonta com tanta movimentação. 
Santa Clara foi assim. Um dia completo. Um dia em que pude enxergar movimentos paralelos, opostos...contrastantes! Eu fui fragmentada! Vestígios soltos pelo ar...
Até amigos, com mais Cuba e suas cidades!